Horizonte de Ti


Tinha a cara coberta, de nariz virado para o mar, respirando a poalha marinha, ia-me cobrindo também progressivamente, pestanejá-va perante os ataques dos grãos de areia, o vento levava-os, trazia-os em picotados na minha face, em rajadas cada vez mais envolventes. O mar esbofeteou-me em plena cara, uma grande onda enrolada num fragor de brisa húmida, sacudindo-me a mente de ar violento. Ao correr das ondas é um lugar onde se pode dar uma imagem à ausência, é um lugar que alivia porque é grande e vazio. Enquanto ficamos ali a olhar as ondas e o céu por cima delas, desdobramo-nos até ao horizonte com o mar. Perante a vastidão imcompreensível do mar, avaliava a medida da ausência de ti, até ao horizonte atrás do qual o mar se desenrola ainda, da dimensão para conter em mim a maré do equinócio da tua ausência. A névoa subia no frio. O ar refrescava mais depressa que o mar, que fumejava em grosso vapor branco para se condensar em chuva fina em mim. Cada vaga que se arqueava no momento de rebentar, expulsava como que entre barbas de baleia um sopro de brisa, de água e de névoa misturadas. A espuma movediça que retinha os ombros da ondulação desfazia-se em cada enrolar, em cada intersecção da rede, cada vez mais fina e difusa no meio de outros pontos pulverizados. Permanecia diante das ondas, a névoa avançava para mim como a ressaca de despenhava da altura do mar, os meus olhos enchiam-se de azul, a areia tomava entidade nua, já sem cor. Depois a névoa refluía com a água, a praia reaparecia, tinha tempo para avistar alguns farrapos de cidade, o piscar incessante do farol ao longe, e a névoa avançava de novo, ainda demasiada ligada à agua para poder desfazer-se dela e liberta-se livremente, a névoa avançava e refluía ao ritmo exacto da saudade, junto ao movimento do meu coração.

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