Contraluz Matinal


O sol nascia atrás da casa, a obscuridade permanecia muito tempo, quando à minha frente os telhados já rutilavam ou desembainhavam deslumbrantes facas, e os raios reflectidos penetravam obliquamente, uma luz estranha, secundária. As ruas ainda estavam sombrias, aquáticas, geladas, azuladas. Sem respiração, sem uma brisa sequer, asfixiadas sob o céu fechado, contemplá-lo tornava-se quase repousante. O céu começava a iluminar-se em baixo, húmido, com clarões em cunha. O horizonte fendia-se. Pássaros que eu não conhecia, num contraluz muito sombrio, agitavam-se turbilhões, subiam em circulos num só ímpeto e depois despenhavam-se, tentavam escapar à luz. Tinha os sentidos tão aguçados pela insónia que via a luz rastejar junto às paredes e a introduzirem-se nas arcadas, provocando sombras frias. Nesse instante, olhei no reflexo ambíguo e vi-te.

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